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Economista do DIEESE ressalta ação sindical inovadora sobre nanotecnologia no Ramo Químico da CUT

30 de Maio de 2015

Nano

A Secretaria de Saúde do Trabalhador da CNQ-CUT está retomando a série de entrevistas sobre nanotecnologia. Na primeira deste ano, Thomaz Ferreira Jensen (foto), economista do DIEESE na subseção do Sindicato dos Químicos do ABC, recupera uma década de ação sindical do Ramo Químico visando conhecer e regular a introdução de nanotecnologias nos processos produtivos.

Jensen é autor de estudos e artigos sobre temas relacionados ao mundo do trabalho, particularmente na indústria química. No tema das nanotecnologias, destacam-se a História em Quadrinhos “Nanotecnologias: Maravilhas e Incertezas no Universo da Química”, publicada pela Fundação Jorge Duprat Figueiredo de Segurança e Medicina do Trabalho do Ministério do Trabalho e Emprego (Fundacentro), em maio de 2010, e a nota técnica “Nanotecnologias e os trabalhadores do ramo químico – um registro da trajetória dos Químicos da CUT no Estado de São Paulo”, editada pelo DIEESE em março de 2009.

Para o economista do DIEESE, “o Brasil necessita de um modelo de desenvolvimento que gere mais e melhores empregos. A introdução de novas tecnologias, se não for acompanhada de medidas de qualificação profissional, que gere novas oportunidades de emprego e repasse os ganhos de produtividades aos trabalhadores, poderá reproduzir, ou até piorar, as situações de desigualdade tão presentes no mercado de trabalho brasileiro”.

A seguir, a entrevista completa.

Quais os riscos das nanotecnologias aos trabalhadores?

As preocupações sindicais referem-se à constatação de que as propriedades dos elementos químicos e materiais se alteram quando manipulados em escala nanométrica. Nosso temor é maior porque sabemos da ausência de estudos mais profundos comprovando que tais elementos e materiais não representam riscos à saúde e ao meio-ambiente. Por isso, apoiamos aqueles cientistas que sugerem cautela nas pesquisas e precaução na utilização das nanotecnologias. Muitas das características que fazem da nanotecnologia um campo promissor, podem produzir efeitos indesejáveis quando se trata de saúde e meio-ambiente.

Na vanguarda da exposição às nanotecnologias estão os trabalhadores em laboratórios de pesquisas, os primeiros a serem expostos a estes novos materiais. Vários estudos internacionais já tem abordado o tema da segurança e saúde nestes ambientes.

Como o movimento sindical atua em relação nanotecnologia?

A ação sindical em relação às nanotecnologias é exemplar dos desafios colocados aos trabalhadores e seus Sindicatos pelo mercado de trabalho brasileiro, marcado por heterogeneidades estruturais decorrentes do subdesenvolvimento e da dependência externa que ainda conformam a economia brasileira. Ao mesmo tempo em que é urgente atuar para alterar ambientes de trabalho precários e insalubres, com maquinário e processos de trabalho obsoletos, que geram mortes e adoecimentos, é necessário incorporar na agenda sindical os riscos emergentes potencialmente associados à introdução de novas tecnologias nos processos produtivos. As nanotecnologias são a fronteira destas inovações na indústria à escala mundial. A partir de pesquisas científicas que remontam à década de 1970, as primeiras inovações tecnológicas que permitiram a incorporação de nanotecnologias na atividade industrial já são encontradas nas principais corporações químicas, farmacêuticas e eletrônicas no final da década de 1980. A introdução de nanotecnologias potencializa a criação de novas moléculas e, portanto, novos produtos e aplicações pela indústria.

A introdução das nanotecnologias em processos produtivos vem ocorrendo principalmente nos países centrais do capitalismo, em que estão sediadas as matrizes das corporações transnacionais. Nos países da periferia, como o Brasil, as nanotecnologias, muitas vezes, podem estar sendo incorporadas aos processos produtivos das filiais destas corporações aqui instaladas, numa relação intra-firma que escapa totalmente ao controle público, seja da sociedade, seja dos órgãos do Estado que deveriam se encarregar desta regulação.

Informações mais recentes dão conta de que, no Brasil, são cerca de 200 empresas envolvidas com projetos e desenvolvimento de produtos em nanotecnologia, interagindo com o setor acadêmico e utilizando recursos públicos para pesquisa (CNPq, FINEP, BNDES). Cerca de 54 destas empresas estão localizadas no Estado de São Paulo, sobretudo nas indústrias químicas (materiais médicos, farmacêuticas e cosméticos). Entre estas, para citar apenas as mais importantes dos setores químicos e farmacêutico, temos: AkazoNobel, Artecola, Basf, Biolab, Braskem, Dow, Elekeiroz, Eurofarma, L´oreal, Lanxess, Luckscolor, Natura, Oxiteno e Rhodia (Grupo Solvay).

Como foi a ação sindical do Ramo Químico sobre as nanotecnologias?

Um tema ganha relevância sindical quando entra para a pauta reivindicatória em uma negociação de data-base. Esta é uma das características do mundo do trabalho no Brasil. E são milhares de cláusulas específicas sobre saúde e segurança no ambiente de trabalho. As nanotecnologias começam a ser debatidas pelo Movimento Sindical brasileiro a partir de 2005, mas ainda em esferas restritas de congressos e seminários. As primeiras atividades de debate sobre o tema foram propostas por entidades sindicais que representam trabalhadores na indústria da alimentação.

No ramo químico, especificamente, o tema aparece pela primeira vez no V Congresso da CNQ-CUT, realizado em junho de 2007, em que se definiu pela necessidade de ampliar o debate sobre o tema, objetivando saber quais os reais impactos das nanotecnologias para os trabalhadores e para a sociedade. Marco decisivo para a difusão das nanotecnologias enquanto tema de preocupação sindical no Brasil, foi a divulgação de nota técnica do DIEESE, em outubro de 2008.

A primeira inclusão das nanotecnologias como item de pauta reivindicatória no Movimento Sindical brasileiro foi feita em agosto de 2008, pela então recém-criada FETQUIM-CUT, que reivindicou a inclusão de cláusula específica sobre nanotecnologia na Convenção Coletiva do Ramo Químico.

Por conta da intransigência patronal, o que se logrou foi incluir o tema como recomendação para as CIPAs abordarem com os trabalhadores nas Semanas Internas de Prevenção de Acidentes (SIPATs). A partir desta inclusão, coube aos Sindicatos e à FETQUIM organizarem processos formativos que contribuíram para que os trabalhadores e os membros das CIPAs efetivassem esta recomendação, o que abriu importantes brechas para coleta de informações em empresas da indústria química que já adotam nanotecnologias e acumulou força para a conquista que se seguiria.

Em abril de 2012, a negociação coletiva entre a FETQUIM e os empresários da indústria farmacêutica no Estado de São Paulo resultou em avanço histórico no âmbito da saúde do trabalhador. O termo aditivo à Convenção Coletiva de Trabalho assinado em 19 de abril entre a FETQUIM e o Sindicato da Indústria de Produtos Farmacêuticos no Estado de São Paulo (SINDUSFARMA) registra, pela primeira vez na história do sindicalismo brasileiro – e, possivelmente, mundial – uma cláusula específica sobre nanotecnologias.

Ao final da negociação coletiva de 2011, foi criado um grupo de trabalho envolvendo as representações dos trabalhadores na indústria química no Estado de São Paulo e o SINDUSFARMA para tratar de temas polêmicos não solucionados no processo de negociação coletiva. Entre estes, as nanotecnologias na indústria farmacêutica e os riscos à saúde dos trabalhadores. Após muitos debates, finalmente o grupo de trabalho bipartite conseguiu uma redação de consenso para a cláusula, introduzida na Convenção Coletiva de Trabalho com o número 69:

NANOTECNOLOGIA

“A empresa garantirá que os membros da CIPA e do SESMT sejam informados quando da utilização de nanotecnologia no processo industrial. A CIPA, o SESMT e os trabalhadores terão ainda acesso a informações sobre riscos existentes à sua saúde e as medidas de proteção a adotar”.

É fundamental destacar que esta cláusula tem por objetivo garantir aos trabalhadores nas indústrias farmacêuticas o direito à informação, condição básica para uma ação sindical qualificada. É igualmente relevante destacar que o foco da cláusula para a ação sindical é, primeiramente, a CIPA, ou seja, a organização dos trabalhadores no local de trabalho. O Sindicato também tem seu papel destacado, mas em conjunto com a organização no local de trabalho.

Na indústria farmacêutica paulista, são mais de 52 mil trabalhadores abrangidos pela cláusula conquistada, dos quais quase 60% em áreas críticas de exposição a nanopartículas, ou seja, em laboratórios e na produção.

Lamentavelmente, esta conquista segue restrita aos trabalhadores nas indústrias farmacêuticas no Estado de São Paulo, dado que as representações patronais dos demais setores industriais químicos (são 12 sindicatos patronais, organizados na FIESP no chamado CEAG-10, abrangendo da petroquímica à transformação plástica, passando pelos cosméticos, tintas e aditivos) seguem negando o direito básico à informação sobre o uso de nanotecnologias nos processos produtivos nas indústrias químicas. Desde 2008, quando a reivindicação foi apresentada pela primeira vez, até 2014, a última negociação havida, foram oito negativas da patronal química a esta proposta sindical.

Os representantes patronais das empresas seguem alegando que as empresas têm pouca informação sobre o assunto. Isso é grave, se for verdadeiro, dado que em todos os seminários e fóruns sobre o futuro da indústria química se apresentam estudos sobre nanotecnologias. As próprias empresas que negam o direito á informação buscam se promover junto a governos, ao BNDES e aos clientes como indústrias inovadoras mencionando as nanotecnologias. Algumas, até usam laboratórios mantidos com recursos públicos para pesquisar sobre aplicações de nanotecnologias em seus produtos.

O Movimento Sindical fez sua parte: estudou a questão a fundo, intensificou a abordagem do tema em atividades de formação, como cursos com membros de CIPA. A negativa patronal da FIESP à reivindicação por acesso à informação sobre nanotecnologias nos processos produtivos revela, em síntese, pequena capacidade de controlar os rumos de incorporação do progresso técnico nas filiais diante do poder das matrizes transnacionais e, sobretudo, descaso com o direito básico dos trabalhadores que querem saber com o que estão lidando nos locais de trabalho. Características do subdesenvolvimento e da dependência que marcam também a indústria no Brasil.