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Para ONU, PEC do teto de 20 anos para gasto público viola direitos humanos

09 de Dezembro de 2016

Brasil

O relator especial da ONU para extrema pobreza e direitos humanos, Philip Alston, considerou a Proposta de Emenda Constitucional (PEC) 55 como sendo uma medida radical e sem compaixão, que ata as mãos dos futuros governantes com impactos severos entre brasileiros mais vulneráveis. Além disso, foi considerada uma violação de obrigações internacionais do Brasil.

Para o especialista, a PEC teve um debate apressado no Congresso Nacional, por imposição do governo Temer e não analisou os efeitos das medidas nos mais vulneráveis, com o congelamento dos gastos públicos. Alston ainda lembrou que tais medidas vieram com um governo que chegou ao poder via impeachment, não tendo jamais passado pelo crivo do povo em uma eleição.

A intenção do governo de congelar o gasto social no Brasil por 20 anos é incompatível com as obrigações de direitos humanos do Brasil, declarou nesta sexta, dia 9, o relator Philip Alston.

Segundo ele, a PEC tem como efeito principal e inevitável o prejuízo aos mais pobres pelas próximas décadas.

“Se adotada, essa emenda bloqueará gastos em níveis inadequados e rapidamente decrescentes na saúde, educação e segurança social, colocando, portanto, toda uma geração futura em risco de receber uma proteção social muito abaixo dos níveis atuais”, afirmou Alston.

Alston, que foi nomeado pelo Conselho de Direitos Humanos das Nações Unidas, recomendou ao governo brasileiro que garanta um debate público apropriado sobre a PEC 55; que estime seu impacto sobre os segmentos mais pobres da sociedade; e que identifique outras alternativas para atingir os objetivos de austeridade.

 “É completamente inapropriado congelar somente o gasto social e atar as mãos de todos os próximos governos por outras duas décadas. Se essa emenda for adotada, colocará o Brasil em uma categoria única em matéria de retrocesso social”, disse ele.

Alston afirmou que um governo que chega ao poder depois de um impeachment não representa a população em seu plano de mudar a Constituição. E isso preocupa mais ainda, pois vai amarrar as mãos de futuros governantes.

Maior país da América Latina, o Brasil sobre sua mais grave recessão em décadas, e o governo alega que um congelamento de gastos estabelecido na Constituição deverá aumentar a confiança dos investidores, reduzindo a dívida pública e a taxa de juros, o que ajudará o país a sair da crise. Mas isso tem impacto severo sobre os pobres, diz Alston.

 “Essa é uma medida radical, desprovida de toda nuance e compaixão”, disse ele. “Vai atingir com mais força os brasileiros mais pobres e mais vulneráveis, aumentando os níveis de desigualdade em uma sociedade já extremamente desigual e, definitivamente, assinala que para o Brasil os direitos sociais terão uma prioridade muito baixa nos próximos vinte anos.”

Alston lembra que o Brasil ratificou o Pacto Internacional dos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais, em 1992, que veda a adoção de ‘medidas deliberadamente regressivas’, a não sem em último caso. Ele apontou os avanços do Brasil ao longo das última décadas, na erradicação da pobreza e reconhecimento dos direitos à educação, saúde, trabalho e segurança social.

“Essas políticas contribuíram substancialmente para reduzir os níveis de pobreza e desigualdade no país. Seria um erro histórico atrasar o relógio nesse momento,” disse Alston.

O relator afirmou que o debate em torno da PEC 55 foi apressado pelo governo, sem participação dos grupos afetados e sem considerar o impacto sobre os direitos humanos. Ele disse que está em contato contato com o governo brasileiro para entender melhor o processo e o conteúdo da emenda, mas declarou que  “mostrar prudência econômica e fiscal e respeitar as normas internacionais de direitos humanos não são objetivos mutuamente excludentes, já que ambos focam na importância de medidas cuidadosamente concebidas para evitar ao máximo consequências negativas para as pessoas”.

“Efeitos diretamente negativos têm que ser equilibrados com potenciais ganhos a longo prazo, assim como esforços para proteger os mais vulneráveis, especialmente os mais pobres, na sociedade”, afirmou Alston.

“Estudos econômicos internacionais, incluindo pesquisas do Fundo Monetário internacional, mostram que a consolidação fiscal tipicamente tem efeitos de curto prazo como redução da renda, aumento do desemprego e da desigualdade de renda. E a longo prazo, não existe evidência empírica que sugira que essas medidas alcançarão os objetivos sugeridos pelo governo”, continuou o especialista.

A relatora especial sobre o Direito à Educação, Koumbou Boly Barry, endossou o apelo do relator especial às autoridades brasileiras.

Relatores especiais são especialistas em direitos humanos apontados pelo Conselho de Direitos Humanos para tratar de questões específicas de país ou temáticas em todo o mundo. Eles não são funcionários da ONU e são independentes de qualquer governo ou organização. Eles servem em capacidade individual e não recebem salário por seu trabalho.

Com informações da ONU

Fonte: Jornal GGN