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Em encontro internacional, trabalhadoras apontam investimento em formação sindical como prioridade

26 de Agosto de 2013

Mulheres

Mulheres de quatro continentes, 20 países e 12 estados brasileiros apontaram caminhos para resistir ao capitalismo que precariza as relações...

Mulheres de quatro continentes, 20 países e 12 estados brasileiros

apontaram caminhos para resistir ao capitalismo que precariza

as relações trabalhistas e aprofunda a divisão sexual do trabalho

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“Queremos mudar o mundo para mudar a vida de todas nós mulheres”. Nesse domingo (25) ensolarado, esta foi a motivação estampada nos diferentes rostos, sotaques, cores e línguas que pouco a pouco ocupavam o centro de São Paulo.
Reunidas num hotel na Rua Martins Fontes, mulheres feministas do movimento sindical de 20 países participaram do 1º Encontro Sindicalismo e Feminismo em Marcha realizado no Brasil, em preparação ao 9º Encontro Internacional da Marcha Mundial de Mulheres (MMM), que ocorre de 25 a 31 deste mês, no Memorial da América Latina.
Com solidariedade e trocas de experiências sobre o enfrentamento à crise mundial, organização e resistência, elas apresentaram contribuições para a defesa dos direitos das trabalhadoras e dos bens comuns, luta contra a violência e investimento em formação sindical.
Segundo a diretora executiva da CUT, Rosana Souza de Deus, o objetivo foi discutir o mundo do trabalho e dar contribuições à 9º MMM. Para ela, a participação de quatro continentes e 12 estados brasileiros permitiu que as dirigentes debatessem a articulação dos movimentos sindical e feminista na conjuntura atual.
“A luta das mulheres é internacional e, por isso, é possível construir políticas unitárias que dialoguem com todos os ramos, categorias e setores. As experiências dos países nos mostram aspectos em comum de resistência das trabalhadoras frente à divisão sexual do trabalho e às desigualdades que permeiam gênero, classe e raça”.
Para Nalu Faria, da Marcha Mundial das Mulheres, o encontro demonstra que é possível construir uma luta conjunta e mundial. “Nosso grande esforço é construir um movimento com mulheres do mundo inteiro em situações tão diversas do ponto de vista histórico, econômico e cultural. Temos sido vitoriosas na capacidade de elaborar agendas comuns”, ressaltou.
Secretário de Relações Internacionais da CUT, João Felício afirma que não é novidade no mundo sindical que o machismo exista em todas as estruturas, mas aponta mudanças. “Nos últimos anos temos visto um avanço considerável das mulheres, que em nossa Central representam o setor que mais cresce. Isso para nós é motivo de orgulho e foi o que fez com que a paridade fosse aprovada. Esta que caminha a passos largos para que no futuro tenhamos uma mulher na presidência da CUT”.

Resistir na crise

A dirigente Khadija Rhamiri, da União Marroquina do Trabalho (UMT) opina que não é possível que exista um sindicato forte em seu país sem que haja uma mulher atuando. “A participação das trabalhadoras é grande nos setores têxtil e agrícola, mas a luta ainda existe contra as péssimas condições de trabalho”.
Em período de crise, ela afirma que a presença das mulheres na produção, no cuidado dos filhos e da casa se torna ainda mais difícil e desigual. “Pagamos no Marrocos o que é ditado pelas instituições financeiras como o FMI e o Banco Mundial. Meu país depende dessas instituições que ditam os programas contra as dívidas”.
Segundo Felício, o mundo sindical vive num momento de maior concentração de renda da história. “A crise se abate sobre o mundo, mas é preciso que isso se dê muito mais sobre as mulheres e a juventude do que sobre outros setores da sociedade”.
Representante da ELA (Euskal Sindikatua), a principal Central Sindical do País Basco, Jone Bengo afirma que entre os problemas enfrentados pelos trabalhadores na Europa, vale lembrar o que se refere à crise dos cuidados. “Um dos pilares do neoliberalismo é a utilização do tempo das mulheres como um recurso que não se acaba. Esta crise foi criada com a exploração do tempo e do trabalho das mulheres, combinada com a falta de responsabilização do Estado e dos próprios homens. E, no cenário atual, é claro que a necessidade das pessoas e do capital não são as mesmas”.
Na Europa, Jone explica que a cada dia as mulheres trabalhadoras têm mais deveres e menos direitos. “Vemos um aumento exponencial de trabalhadoras desempregadas e sem apoio social do governo, combinada com uma espécie de desmantelamento do Estado”.
Para a vice-presidente da CUT, Carmem Foro, em tempos de crise mundial, a Central tem sido um exemplo para a luta feminista das trabalhadoras. “O Brasil vive um momento que se diferencia um pouco da realidade vivida no mundo, mas isso não quer dizer que nós não tenhamos os mesmos problemas que todas as sindicalistas do mundo inteiro têm, como em questões como o aborto e a violência. Entre nossas principais lutas, enfrentamos hoje no Brasil um Projeto de Lei (PL 4330/04) que pretende terceirizar sem limites e precarizar as relações de trabalho”.
Carmem também destacou a defesa de algumas categorias e a política de valorização do salário mínimo como uma conquista das centrais sindicais do último período. “Nesses últimos tempos, a consolidação do direito das domésticas foi uma das principais bandeiras. Estamos saindo de uma ideia de escravidão, com muita resistência do setor conservador que a vida toda entendeu que as mulheres saíram diretamente da senzala”.
Segundo Khadija, no Marrocos, a situação das mulheres se caracteriza por salários baixos em relação ao dos homens, horas adicionais não pagas, horário de trabalho não respeitado e demissões abusivas. “Ainda, há o assédio moral e sexual nas indústrias têxteis e nas fazendas. Por isso, organizamos campanhas e formação sindical para integrar o sindicato à Marcha e o feminismo dentro do sindicato. Envolvemos também os homens nesse processo de formação porque não podemos aplaudir com só uma mão - como dizemos em nosso país, isso tem que ser feito em conjunto”.logo meninas

Experiências e contribuições

Dirigente da Plenária Intersindical dos Trabalhadores – Convenção Nacional (PIT-CNT), central única sindical do Uruguai, Alma Fernandez relata que a descriminalização do aborto foi resultado de uma intensa luta feminista. “Construímos uma aliança estratégica num enfrentamento de quase 12 anos. Agora temos um aborto seguro no país”.
Ela afirma que, após a legalização, o país não registra morte de mulheres por aborto e afirma que a conquista foi fruto de um trabalho realizado de porta em porta com a população.
Marie France Benoit, da CSN (Confederação Nacional de Sindicatos do Canadá), onde se originou a Marcha Mundial de Mulheres, em 1998, destaca que  a autonomia econômica das trabalhadoras, o controle por seu próprio corpo e a unidade dentro dos movimentos feminista devem ser prioridades na luta.“Temos acesso ao aborto e não existe uma lei que impeça isso em nosso país. Continuaremos resistindo para que não tenhamos que presenciar retrocessos. A unidade do movimento das mulheres e do movimento sindical é o que nos permitirá avançar em nossa luta”.
Ana Sebastião Diogo, Secretária Executiva do Comitê Nacional da Mulher Sindicalizada da União Nacional dos Trabalhadores Angolanos - Confederação Sindical (UNTA-CS), explica que a constituição angolana reconhece que “a mulher não deve ser discriminada e tem o mesmo direito que os homens. Mas na prática não é isso que acontece”.
Como comparativo ao desafio do Brasil em garantir o trabalho decente, Ana salienta que “é preciso lutar por proteção social porque em Angola também há situações parecidas, onde as trabalhadoras são discriminadas e marginalizadas”.
Em Marcha até que sejamos livres - No evento das sindicalistas, as dirigentes apontaram investimento em formação sindical como prioridade. O fim da violência institucional, especialmente a que se produz nas organizações sindicais também foi um dos itens aprovados. Outro encaminhamento foi de que as centrais sindicais promovam, ainda, maiores campanhas contra toda a forma de violência às mulheres em todos os lugares onde estas realizam as suas atividades sociais.
As lideranças aprovaram ainda, de forma unânime, a realização de campanhas para denunciar as tentativas de dessindicalização dos trabalhadores/as das multinacionais. Por fim, discutiram sobre a necessidade de intervir na elaboração de programas de formação dentro do espaço sindical, inserindo a questão de gênero e ampliando a participação das trabalhadoras.
Agenda – A partir desta segunda (26), o público pode visitar a exposição Feminismo em Marcha, na Galeria Olido, centro paulistano, onde estão expostas fotos e projeções que retratam a atuação da Marcha em 62 países.
O 9º Encontro Internacional da MMM termina no dia 31 de agosto, com uma grande mobilização de rua, com concentração a partir das 14h no vão livre do Masp e caminhada até o centro de São Paulo.
Clique aqui para conferir a programação e as informações do 9º Encontro Internacional da MMM.

 

 

 

Foto: Roberto Parizotti/CUT

 

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