Escrito por: Emir Sader
VoltarDireita não consegue resolver a crise que criou
06 de Junho de 2017
Fracasso do governo de Temer leva a um novo dilema aos que deram curso ao golpe: mantê-lo ou derrubá-lo para colocar um novo nome sem tanta unidade?
Desde as denúncias mais recentes, o governo brasileiro ficou reduzido à sobrevivência de Michel Temer no poder, perdeu toda capacidade de iniciativa e passou a ter o objetivo único de se demorar o mais possível antes da queda. O pais fica ao deus-dará. A direita, que forjou essa via do golpe, se mostra incapaz de dar continuidade a ele e sem coragem de enfrentar as eleições diretas.
À direita não importava o que se fizesse para chegar ao objetivo maior – tirar o PT do governo. Todo tipo de aliança e de meio servia para obter esse fim e foi isso que levou ao golpe, com o vice-presidente à frente.
A presença blindada da equipe de Meirelles e os seus banqueiros representava a garantia de que a restauração do projeto neoliberal seria preservada. O pacote de reformas mandado ao Congresso era a expressão dessa restauração, junto com as políticas de ajuste e o desmonte da Petrobras.
Para isso o governo golpista contava com o grande empresariado, com a velha mídia e com uma folgada maioria no Congresso. Aprovar os retrocessos em termos de direitos dos trabalhadores e das políticas sociais era o termômetro do sucesso do governo e do próprio golpe.
A combinação entre a agressividade da Lava Jato contra o PT – elemento indispensável no golpe – e a fragilidade do governo pela sua composição de grande parte de corruptos, era um elemento frágil do governo, mas que serviu até quando ele pôde tocar as reformas no Congresso e o desmonte da Petrobras. As últimas denúncias deixaram o governo perto do nocaute. Está perdido, sem ação, isolado, na contagem regressiva para o seu melancólico final.
Mas esse esgotamento de Michel Temer mostra como a direita destrói seu próprio governo, sem ter construído alternativas. Numa atitude aventureira derrubou um governo legalmente eleito para colocar um bando de ladrões para dirigir o Estado brasileiro. Agora está prestes a tirá-los do poder, mas sem ter alternativa com um mínimo de legitimidade e de apoio.
O país paga um preço alto por essas aventuras da direita brasileira. Voltou a haver um forte processo de concentração de renda, depois de termos conseguido, pela primeira vez na nossa história, diminuir significativamente a desigualdade. Os direitos dos trabalhadores tiveram um enorme retrocesso, depois de estes terem conquistado os maiores avanços na história do movimento no Brasil. As políticas sociais foram afetadas duramente, depois de o país ter saído do Mapa da Fome, igualmente ela primeira vez na nossa história.
O fracasso do governo de Temer leva a um novo dilema à direita que o guindou ao poder: mantê-lo, com o risco de que o governo se desagregue, sendo derrubado pelas denúncias de corrupção e já sem capacidade de aprovar o pacote de medidas que tanto interessa às elites brasileiras? Ou correr o risco de uma operação difícil de conseguir outro consenso para impor um novo Temer, mas sem poder contar com a unidade das mesmas forças que impuseram o golpe?
As vozes que sentem que as eleições diretas são o único caminho legítimo aumentam, mas na direita elas contam com a inviabilização da candidatura de Lula – que tem como vencedor seguro nas diretas. Mesmo sem ele, tem medo de que vença quem ele vier a apoiar.
A direita entrou num beco sem saída e termina fazendo com que o país, nas suas mãos, se encontre nessa mesma situação. Serão meses de disputa intensa, de caráter político e institucional, de massas, de ideias, da qual sairá um país distinto.
Ou a direita se aferra de qualquer maneira ao governo, tendo que aumentar a repressão e a violação das normas constitucionais e jurídicas, ou o país entra em um processo de redemocratização e reconstrução nacional, conduzido de novo pela esquerda.
Emir Sader é sociólogo e cientista político