Escrito por: Imprensa CUT
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01 de Abril de 2013
Direto da Tunísia, uma avaliação do protagonismo das mulheres Por Rosana Sousa de Deus* Desde a Tunísia, no Fórum Social...
Direto da Tunísia, uma avaliação do protagonismo das mulheres
Por Rosana Sousa de Deus*
Desde a Tunísia, no Fórum Social Mundial, que é um momento de unidade dos movimentos sociais e respeito à diversidade, participamos de um grande ato liderado pelas mulheres. Foram muitos os idiomas presentes, mas o sentido da fala de todas era único: outro mundo só é possível com mais justiça, igualdade e liberdade para as mulheres.
Na Tunísia as mulheres tiveram protagonismo nas denúncias do regime ditatorial e persistem exigindo que a nova Constituição garanta a elas o direito e a liberdade. No Fórum Social Mundial afirmamos nossa solidariedade à luta de todas as mulheres do mundo.
Ainda que em muitos países do ocidente tenhamos celebrado conquistas, como a Lei Maria da Penha no Brasil, esta só foi possível porque muitas mulheres saíram às ruas para denunciar a violência e exploração a que estavam submetidas em seus lares e ambiente de trabalho. As passeatas e protestos que ocorreram nos anos 60 tiveram o papel de mostrar que a desigualdade entre homens e mulheres não é um fenômeno natural. Queimar o sutiã significou naquele momento que nós mulheres estávamos dispostas a questionar e refutar o papel a que a sociedade nos relegava: seres frágeis, padrões de beleza, dóceis, destinadas a cuidar e zelar pela família.
No Brasil, a partir dos anos 80, os movimentos de mulheres passam a incorporar a luta contra a violência como uma de suas principais frentes de ação e a demandar políticas públicas para prevenção e atenção às mulheres vítimas de violência.
O mundo do trabalho também é um espaço no qual persistem as violações dos direitos das mulheres. Enquanto sindicalistas conhecemos essa realidade. Debatermos sobre ela é um passo para que possamos combatê-la, em especial a violência contra as mulheres. A violência, seja ela doméstica ou no ambiente de trabalho, não é um problema individual, mas de todas as mulheres e é a faceta mais cruel das desigualdades entre homens e mulheres em nossa sociedade, ela não tem idade, cor ou classe.
Sobre as mulheres recai o peso de uma sociedade que espera de nós determinados comportamentos: o modo como nos vestimos (o comprimento da saia, o decote), como cortamos o cabelo (se está preso ou não, comprimento, a cor), o tom de voz com que falamos, aspectos físicos (cor, peso), orientação sexual, etc.
As mudanças no mundo do trabalho também são um dos fatores que têm como consequência a violência contra as mulheres. Exige-se das mulheres: multifuncionalidade, visão geral do processo de produção, rotação de tarefas e flexibilidade. Cada vez mais a responsabilidade da manutenção do emprego é jogada sobre as trabalhadoras, logo é necessário estar a cada dia mais eficiente, qualificada e competitiva, produzindo mais com o menor custo. A competição entre as empresas força as trabalhadoras a adaptarem-se às mudanças e também competirem entre si, levando a um maior isolamento e falta de espírito coletivo e solidariedade.
Embora defendamos que as responsabilidades familiares e domésticas sejam de homens e mulheres, no ambiente de trabalho as mulheres são duplamente discriminadas por assumirem uma carga que deveria ser compartilhada. No momento de admissão se analisa o estado civil e o número de filhos. O controle e a pressão se estendem à rotina de trabalho criando constrangimentos diante de uma possível gravidez e também no caso de faltas e ausências para cuidar de filhos ou familiares doentes. Essa desigualdade de tratamento é utilizada como justificativa para o salário inferior das mulheres em relação aos homens, que em algumas profissões pode chegar a 70%, mesmo quando cumprem as mesmas tarefas. É nosso dever cobrar do Estado políticas que alterem a desigualdade salarial, por exemplo, mais creches para as crianças, casas de convivência e políticas de apoio para idosos.
O assédio moral e sexual ou violência moral é reconhecido como um sério problema no ambiente de trabalho. Esse tipo de violência atinge especialmente as mulheres, os homossexuais e aquelas que têm menor escolaridade.
No ambiente de trabalho o assédio sexual e moral são as formas mais comuns de violência relatada pelas mulheres. O ato de deixar a mulher constrangida com o intuito de obter vantagem ou favorecimento sexual a partir de uma relação de poder em que a mulher tem medo de perder seu emprego. O assédio sexual pode ocorrer fisicamente (manuseio, palmadas, contatos físicos desnecessários, beliscões, bilhetes e mensagens não desejados) ou verbal (solicitar favor sexual em troca de promoção, piadas, assovios, etc).
O assédio moral é o que chamamos das condutas abusivas que ferem a dignidade e integridade física ou psíquica, que podem degradar o clima de trabalho. Acontece quando a trabalhadora é exposta a situações humilhantes e constrangedoras de maneira repetitiva e prolongada durante a jornada de trabalho. A vítima pode ser desqualificada e desestabilizada emocionalmente. Esse tipo de humilhação leva a uma perda da autoestima e interfere no rendimento e qualidade do trabalho. A maior parte desses agressores são homens, chefes ou superiores, mas pode vir a acontecer mesmo entre colegas.
No movimento sindical é fundamental que a CUT, Confederações, Federações e Sindicatos assumam essa luta pelo fim da violência contra a mulher como uma pauta pública e política, que também está relacionada ao mundo do trabalho. Também são necessárias campanhas de informação e sensibilização sobre o tema. Nos acordos coletivos é necessário garantir proteção contra as práticas de assédio moral e sexual.
Como Central Única dos Trabalhadores, lembramos que o acesso ao trabalho decente, sem violência física, moral e sexual, é uma forma pela qual às mulheres podem construir sua autonomia e amor próprio. A construção da autonomia econômica das mulheres está relacionada com o estímulo à qualificação de mulheres, valorização do salário mínimo e ampliação de empregos com carteira assinada, especialmente no trabalho doméstico. Temos que cobrar do Estado políticas de valorização do salário mínimo, creches e acesso à moradia, assim como o compromisso de prevenção e combate à violência sexista para que as mulheres conquistem sua liberdade e a igualdade.
Um outro mundo com condições dignas para as mulheres é possível e necessário!
* Rosana Sousa de Deus é integrante da Executiva Nacional da CUT e diretora
do Sindicato dos Químicos e Plásticos de São Paulo
Foto: Dino Santos/Acervo CNQ-CUT