Dilma, não entregue nosso pré-sal para empresas estrangeiras
29 de Setembro de 2013
Geral
"Não admitimos dividir a nossa riqueza com capitalistas estrangeiros. Lutaremos por nossas ideias e pelos interesses do povo...
"Não admitimos dividir a nossa riqueza com capitalistas estrangeiros.
Lutaremos por nossas ideias e pelos interesses do povo brasileiro."
Por João Pedro Stédile *
No dia 21 de outubro, a ANP (Agencia Nacional de Petróleo) vai leiloar o maior campo de reservas de petróleo brasileiro, encontrado a 180 km do litoral, com sete mil metros de profundidade.
Lá estão depositados comprovadamente de 12 a 14 bilhões de barris de petróleo. É equivalente a todas as reservas do México. Corresponde a tudo que a Petrobras já explorou nos seus 60 anos de existência.
A importância estratégica para o país é tão grande que durante o debate do segundo turno, da campanha de 2010, a candidata Dilma Rousseff disse que o candidato José Serra queria privatizar e fazer um leilão do petróleo, e que isso era inadmissível, pois o pré-sal deveria ser uma riqueza a ser utilizada apenas em favor do povo Brasileiro.
Três anos depois, em mensagem pública em rede de televisão, a presidenta muda o discurso e assume o que Serra queria fazer, leiloar as reservas do pré-sal para a iniciativa privada.
Como será leiloada tamanha riqueza?
A ANP abriu as inscrições e nada menos do que 11 grandes empresas petrolíferas do mundo se habilitaram. Sete são empresas estatais da China, Índia, Portugal, Espanha e Noruega. Três são empresas privadas transnacionais e mais a Petrobras.
A empresa que fizer a melhor oferta de partilha em percentual do petróleo explorado ganhará o leilão ou poderão acontecer parcerias.
Quem ganhar vai pagar ao governo brasileiro R$ 15 bilhões, no mínimo. Esse dinheiro vai para o Tesouro Nacional, que provavelmente vai botar na caixa comum, aquela mesma que paga os juros da dívida interna para não mais de 5 mil acionistas de bancos.
Depois do leilão, a empresa ganhadora deve seguir a nova regra de partilha, que passou a vigorar no governo Lula. A empresa extrai o petróleo e paga 15% de royalties que, por sua vez, são redivididos entre União, Estados e municípios.
Dos 5% que irão para a União, 75% serão destinados para a educação e os outros 25% para saúde. Os Estados e municípios podem fazer o que quiserem com os royalties e investir em qualquer coisa
Portanto, não é certa a propaganda de que a renda do petróleo vai para a educação. Apenas ao redor de 15% do total, que são os royalties, podem ter alguma finalidade social.
Além dos royalties, as empresas descontam o custo real de produção da extração. Com isso, vem a partilha. A empresa é obrigada a entregar 50% do saldo, em petróleo, para a União, que certamente vai repassar à Petrobras. Os outros 50% seguramente serão exportados como petróleo cru para os países de origem das petroleiras.
Portanto, independente de qualquer argumento, na prática, estamos entregando 50% de todo o petróleo do pré-sal para as empresas estrangeiras, que despacham o óleo negro para seus países, sem pagar mais nada. Nem impostos nem royalties.
Entrega de 50% da produção em troca de sua exploração
Pela Lei de Partilha, aprovada durante o governo Lula, há um artigo que diz que a União poderá entregar toda a reserva do pré-sal para exploração exclusiva por parte da Petrobras, sem necessidade de leilão. Por que não fazemos isso?
O governo e os colunistas nos jornais têm defendido que a Petrobras está endividada e não tem caixa para investir. O BNDES tem uma política de crédito para tantas empresas privadas, inclusive transnacionais e picaretas em geral, como o Eike Batista. Por que não poderia emprestar para Petrobras?
Por que o Tesouro Nacional – em vez de pagar juros a meia dúzia de especuladores de títulos da divida interna, que levam R$ 200 bilhões por ano – não aplica recursos em investimentos do pré-sal?
Aliás, foi assim que o presidente Lula fez na crise de 2008, quando orientou o desconto do superavit primário e destinou R$ 100 bilhões para o BNDES investir no setor industrial. Medidas desse tipo que fizeram a economia brasileira caminhar e impediram o povo brasileiro de sentir os maiores efeitos da crise internacional.
A Petrobras é uma das maiores empresas do mundo e, certamente, tem crédito para conseguir empréstimos também no exterior. Ou alguém acha que as empresas concorrentes têm dinheiro em caixa? As grandes petroleiras vão ao mercado tomar dinheiro emprestado.
As estatais chinesas podem ser as ganhadoras do leilão. Para isso, o Tesouro chinês liberará bilhões de dólares das reservas para as empresas explorarem e levarem o petróleo cru para a China. Ou seja, vão fazer o que o Tesouro brasileiro não tem coragem.
O governo e os setores neoliberais defendem que esses investimentos estrangeiros são necessários para a economia voltar a crescer. Ora, alguém notou alguma diferença no PIB brasileiro depois de realizados 11 leilões de petróleo entregues para as empresas transnacionais?
Essas empresas estrangeiras que ganharem os leilões usam tecnologias de suas matrizes e já trazem os equipamentos. Dos 67 navios petroleiros construídos no Brasil no governo Lula, 63 foram comprados pela Petrobras e quatro pela venezuelana PDVSA.
Nenhuma empresa transnacional que ganhou outros leilões construiu plataformas no Brasil. Nem contrataram engenheiros o operários qualificados para suas instalações.
Um colunista de plantão afirmou recentemente que o governo Dilma tem de fazer o leilão logo, pois se os tucanos voltarem ao governo farão do seu jeito. Ora, que argumento mais insólito, fazer logo uma política equivocada porque os nossos adversários fariam mais rápido. Santa paciência.
Petróleo é riqueza do povo
O povo brasileiro precisa dessa riqueza para investir em educação, saúde e tecnologia, como prometeu a candidata Dilma em campanha
As nossas riquezas não podem ser exportadas como petróleo cru para resolver os problemas da China, Espanha e Portugal. Nós temos pressa é de reformas estruturais que possam acelerar as soluções dos problemas do povo.
Precisamos de investimentos em transporte público, tecnologia, indústria nacional, que gerem empregos de qualidade para o povo brasileiro. Nada disso virá de leilões de petróleo. Se leilões resolvessem os problemas sociais, não haveria tanta insatisfação nas ruas depois de onze leilões.
A alternativa é dar exclusividade para a Petrobras, que com empréstimos do BNDES, do Tesouro ou mesmo no mercado internacional poderia extrair o petróleo, com sua tecnologia e trabalhadores brasileiros. Depois, industrializar esse óleo para gerar ainda mais riquezas e impostos no Brasil.
O que está em jogo é a nossa soberania nacional sobre uma riqueza estimada em um US$ 1 trilhão a ser retirada em 30 anos. O povo brasileiro vai dividir essa riqueza com as empresas estrangeiras? Quem não gostaria de ter garantido o acesso a US$ 500 bilhões ao longo de 30 anos ?
Diante disso, especialistas da universidade, técnicos da Petrobras, dirigentes que atuaram no próprio governo Lula-Dilma, sindicatos dos petroleiros, centrais sindicais e movimentos sociais nos reunimos recentemente em uma plenária e decidimos fazer uma campanha nacional pelo cancelamento do leilão.
O Brasil descobriu uma imensa reserva depois de décadas de pesquisa financiada pelo povo. Temos a garantia constitucional de que o petróleo pertence a todo o povo. Temos tecnologia necessária para explorá-lo.
Esperamos que a presidenta Dilma não entre na história do país no mesmo capítulo que o FHC, referente à entrega das nossas riquezas. FHC entregou os nossos minérios, privatizando a Vale do Rio Doce, a Embraer, as ferrovias e as empresas de telecomunicações.
Não admitimos dividir a nossa riqueza com capitalistas estrangeiros. Lutaremos por nossas ideias e pelos interesses do povo brasileiro. Um governo passa rápido, mas a história de um povo é eterna.
* João Pedro Stédile é integrante da coordenação nacional do MST
(Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem-Terra) e da Via Campesina
Foto: Fabio Rodrigues/Agência Brasil