Diálogos sobre a Lava-Jato no Brasil e Mãos Limpas na Itália: semelhanças e contradições
23 de Maio de 2016
Brasil
Atividade foi organizada por D'Avila Coelho Advogados Associados, com apoio da CNQ, Fetquim e Sindicatos dos Químicos de SP e do ABC
As chamadas Operação Lava Jato, em curso no Brasil, e a Operação Mãos Limpas, ocorrida na Itália no início dos anos 90, ganharam as manchetes de jornais e conquistaram o coração de grande parte da população brasileira, e na época da população italiana, sob a ideia de combate intransigente à corrupção. Mas ambas são muito controversas.
Na Itália hoje, a corrupção é uma das maiores da sua história e a lembrança que ficou é Mãos Limpas como uma triste história.
No Brasil, o espetáculo midiático, os exageros e o uso político e partidário das delações mancham a credibilidade da Operação Lava Jato que, inclusive, está com os dias contados para acabar, exceto para punir os petistas, após a oposição conseguir golpear a democracia, aprovando o início do processo de impeachment da Presidenta Dilma no Congresso Nacional.
Essa comparação entre as duas operações, com suas semelhanças, contradições e consequências foi tema da atividade "Diálogos sobre a Operação Lava Jato no Brasil e a Operação Mão Limpas na Itália", promovida pelo escritório DÁvila & Coelho Associados em parceria com a CNQ-CUT; Fetquim -SP e os sindicatos Químicos de São Paulo e Químicos do ABC., no dia 12 de maio passado, no Hotel Braston, centro de São Paulo.
Quem contextualizou a Operação Lava Jato, foi a advogada criminalista Danyelle Galvão, que é atuante no processo da Operação Lava Jato. Vindos diretamente de Milão, Itália, a advogada militante em Milão, Daniela Rubino, e o sindicalista da CGIL, que também é professor de Filosofia e Letras em Milão, Carlos Casti, abordaram o histórico e os resultados da Operação Mãos Limpas (Mani Pulite, em italiano). Entre os presentes para assistir às apresentações e participar do debate estavam advogados, sindicalistas e militantes.
Delações premiadas direcionadas
A advogada Danyelle Galvão, atuante na Lava Jato, coloca algumas inquietações sobre o processo que tem como instrumentos principais a delação premiada, a prisão preventiva e a condução coercitiva. “O que se diz na delação vira manchete de jornal e revista e é considerada como verdade. Mas um fato pode ter diferentes versões, quatro delatores podem apresentar quatro versões diferentes. O delator tem o dever de falar a verdade e diante disso a investigação prossegue, mas como ficam os delatores quando há versões conflitantes?”, questiona.
“Mãos Limpas só serviu para beneficiar os mais espertos”
Daniela Rubino contou a história da Operação Mãos Limpas que aconteceu no início dos anos 90 na Itália e, a partir de um caso de propina de 3.500 euros em uma Casa de Repouso, se converteu em uma investigação política. No início da operação, todos os empresários que tiveram que pagar propina para a Polícia começaram a denunciar os “ladrões”, porém, ressalta Daniela, esses empresários também era ladrões.
“Se um empresário paga para ter um contrato ele está violando a livre concorrência e isso causa um grande prejuízo a toda a sociedade, portanto a delação foi um meio para esses empresários criminosos usaram para acusar os políticos e se livrarem da acusação”, disse.
A partir daí a Itália passou a ser um país sem controle, a máfia chegou a matar dois dos mais importantes juízes anti-máfia em atentados violentos. “É uma das piores páginas da nossa história”, afirmou a advogada.
Silvio Berlusconi e o monopólio da mídia
Assim como o Brasil, a mídia na Itália também era um monopólio de famílias e Silvio Berlusconi usava de três redes televisivas regionais e um jornal impresso nacional para se pronunciar aos italianos. Assim, fez passar a ideia de que os juízes que combatiam a corrupção eram comunistas e estavam a serviço de Moscou. E diante de uma sociedade conservadora e preconceituosas, ele funda um partido e ganha o apoio da população. Os juízes encerraram os trabalhos e as investigações demoraram muito para chegar a um resultado definitivo.
“Ela (a Operação Mãos Limpas) não serviu para moralizar nosso país, só serviu para beneficiar os mais espertos. Os mais fracos perderam para os mais fortes, que agora seguem mandando no país e fazendo pior do que era feito antes”, concluiu Daniela.
O que sobrou da Operação Mãos Limpas de positivo? Segundo Daniela, agora a lei italiana para financiamento dos partidos é mais rígida.
O sindicalista e professor de Filosofia Carlos Casti comentou sobre as dificuldades que o movimento sindical vem enfrentando e encerrou as apresentações fazendo um chamado à resistência. “Com tudo o que está acontecendo hoje no Brasil precisamos reinventar nossa fragilidade como oportunidade, temos que ter uma visão otimista, pois a vida continua”, disse.
Para exemplificar sua ideia, usou a metáfora da arquitetura japonesa que usa ouro para restituir um material corroído ou quebrado. “O objeto se torna mais precioso do que era antes de quebrar. O ouro é a nossa vontade, nossa solidariedade, nosso olhar ao outro”, explicou. “Por isso a presença feminina vem avançando em muitos lugares, pois isso nos faz pensar um mundo mais humano, mais cuidadoso com o outro”, afirmou.