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OPINIÃO | Um novo tempo para o movimento sindical

12 de Novembro de 2025

Ramo Químico

Por Elaine Blefari, Jorge Pinho, Maicon Borges, Paulo de Souza e Thiago Rios*

 
O Brasil está sediando a COP30, a Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas, que acontece até o dia 21 de novembro, em Belém do Pará, no coração da Amazônia.
Pela primeira vez, o principal fórum global sobre clima aconteceem território amazônico, colocando o país no centro das atenções quando o assunto é sustentabilidade, reindustrialização e justiça social.
Para nós, trabalhadores e dirigentes da indústria química, esse evento vai muito além dos discursos diplomáticos. Ele impacta diretamente em nossas fábricas, nos nossos empregos e no futuro da indústria nacional.
A COP30 será um marco que pode redefinir a forma como o Brasil produz, exporta e se relaciona com o mundo - e, por isso, o movimento sindical precisa ocupar esse espaço com voz ativa e propostas concretas.
 
O papel estratégico da indústria química
A indústria química é a espinha dorsal de diversos setores produtivos - da agricultura à saúde, da energia aos bens de consumo.
Por outro lado, é também um dos segmentos mais intensivos em energia e emissões de carbono, o que a coloca sob forte pressão para reduzir impactos ambientais e modernizar processos.
Esse é o grande desafio: crescer com sustentabilidade, sem sacrificar empregos e direitos.
A transição ecológica é inevitável — e deve ser construída com planejamento, inovação tecnológica e diálogo social, garantindo que a transformação verde beneficie toda a classe trabalhadora.
 
Descarbonizar sem desempregar
O mundo caminha para uma economia de baixo carbono. Isso representa oportunidades para o Brasil — um país com abundância de biomassa, energia limpa e base tecnológica consolidada —, mas também riscos se as mudanças forem impostas sem negociação.
A indústria química pode se reinventar por meio de produtos de origem renovável, como biopolímeros, biofertilizantes e solventes sustentáveis.
Mas essa mudança precisa vir acompanhada de políticas de transição justa, que assegurem empregos, renda e capacitação profissional.
O movimento sindical deve lutar por:
- Inclusão de planos de transição justa nos acordos coletivos;
- Estabilidade no emprego durante a implementação de novas tecnologias;
- Programas de formação e requalificação profissional, com apoio de empresas e governo;
- Criação de comissões paritárias de sustentabilidade em todas as plantas industriais.
Não existe transição verde verdadeira se ela gerar desemprego e exclusão social.
 
Bioeconomia e desenvolvimento regional
A COP30 recoloca a Amazônia e a biodiversidade brasileira como pilares de um novo modelo de desenvolvimento.
A chamada bioeconomia pode transformar recursos naturais e conhecimento tradicional em produtos de alto valor agregado; e a indústria química pode ser a ponte entre ciência, tecnologia e sustentabilidade.
Mas para que essa transformação seja justa, é fundamental que o trabalho decente e a inclusão social sejam eixos centrais.
O movimento sindical deve garantir que as novas cadeias produtivas gerem empregos formais, locais e de qualidade, valorizando as comunidades amazônicas e os saberes tradicionais.
Também é estratégico fortalecer parcerias entre universidades, institutos tecnológicos e sindicatos, para garantir que o avanço científico caminhe lado a lado com valorização do trabalhador e soberania nacional.
 
Diplomacia industrial e soberania nacional
As mudanças climáticas também têm dimensão geopolítica e econômica.
O surgimento de barreiras verdes, como o Mecanismo de Ajuste de Carbono da União Europeia (CBAM), pode impactar diretamente as exportações da indústria química brasileira.
Por isso, o país precisa de uma política industrial verde, que combine inovação, competitividade e proteção do trabalho nacional.
O movimento sindical, por sua vez, deve fortalecer sua diplomacia internacional, participando ativamente de redes de trabalhadores globais — como fazemos na Rede de Trabalhadores na BASF América do Sul —, para trocar experiências, construir solidariedade e influenciar políticas globais de sustentabilidade com base em justiça social.
 
Transição energética e a nova geopolítica Norte–Sul
A corrida global pela descarbonização também está criando uma nova fronteira de exploração: o Sul Global como fornecedor de energia limpa para o Norte.
Esta tendência exige olhar crítico e estratégico, há um movimento silencioso de recolonização energética. Países desenvolvidos querem que o Sul produza hidrogênio, exporte biomassa, forneça vento e sol, enquanto eles ficam com o valor agregado, a tecnologia e os empregos.
Esse desequilíbrio ameaça transformar a transição verde em uma nova forma de dependência.
Enquanto o Hemisfério Norte consolida seus planos de segurança energética, o Hemisfério Sul arrisca comprometer seus recursos naturais e sociais — água, vento, território e trabalho — em nome de metas impostas pelo mercado internacional.
Precisamos garantir que o Brasil e, em especial, a região nordeste não sejam apenas celeiros de energia limpa, mas potências industriais e tecnológicas dessa nova economia.
O desafio é romper com a lógica exportadora e construir um modelo de transição justa e soberana, que converta nossas vantagens naturais em progresso social e reindustrialização verde, com protagonismo da classe trabalhadora e desenvolvimento regional.
 
O papel do sindicalismo na transição ecológica
A COP30 é mais que um evento: é um chamado à ação.
O sindicalismo brasileiro tem o dever histórico de protagonizar a construção da nova economia verde, garantindo que a transição ecológica seja também uma transição trabalhista e socialmente justa.
Precisamos:
- Unir sindicatos da cadeia química, petroquímica, farmacêutica e biotecnológica;
- Formar e conscientizar nossas bases sobre os impactos e oportunidades da agenda climática;
- Dialogar com governos e empresas de forma propositiva e combativa;
- Defender políticas públicas que articulem sustentabilidade, reindustrialização e valorização do trabalho.
 
Conclusão: o futuro é verde, mas deve ser também dos trabalhadores
A COP30 pode marcar o início de um novo ciclo de desenvolvimento para o Brasil — mais verde, mais justo e mais soberano.
Mas isso só será possível se os trabalhadores estiverem no centro das decisões.
Nenhuma transição será justa se deixar o trabalhador para trás.
Não basta trocar a fonte de energia. Precisamos mudar o modelo de desenvolvimento, colocando o trabalhador no centro da transformação
A economia verde precisa ter rosto, voz e participação da classe trabalhadora.
Nosso desafio é garantir que a transição ecológica se traduza em emprego, renda, dignidade e soberania nacional.
Essa é a luta da nossa geração — e o sindicalismo químico brasileiro está pronto para enfrentá-la.
 
*Elaine Blefari é secretaria de Relações Internacionais da Confederação Nacional do Ramo Químico (CNQ) e dirigente do Sindicato dos Químicos de São Paulo; Jorge Alves de Pinho é secretário de Comunicação da CNQ, presidente da FETRAQUIM/RJ e coordenador-geral do Sindiquimsulf/RJ; Maicon Borges é dirigente da CNQ, do Sindiquímica Bahia, da Rede de Trabalhadores da Indorama e coordenador do Macrossetor da Indústria da CUT/BA; Paulo de Souza Bezerra é secretário do Setorial Química e Plástico da CNQ; e Thiago Rios é coordenador da Rede de Trabalhadores na BASF América do Sul, secretário da Regional Nordeste da CNQ e secretário de Formação do Sindiquímica Bahia.

O conteúdo deste artigo reflete as ideias e experiências pessoais do(a) autor(a), não expressa necessariamente a posição da CNQ, mas reafirma o compromisso da entidade com o diálogo e a diversidade de visões no Ramo Químico.