Químicos ABC: debate revela participação da indústria química na ditadura militar
03 de Setembro de 2013
Cultura
O jornalista e escritor Alípio Freire, membro do conselho editorial do jornal Brasil de Fato, esteve reunido na segunda-feira (dia 2) com os...
O jornalista e escritor Alípio Freire, membro do conselho editorial do jornal Brasil de Fato, esteve reunido na segunda-feira (dia 2) com os químicos do ABC (SP) para debater as motivações do golpe que implantou a ditadura civil-militar no Brasil, em 1964, com destaque para a participação de empresários e banqueiros no financiamento à repressão.
Alípio foi militante da Ala Vermelha, grupo que se lançou na resistência armada contra a ditadura. Preso em setembro de 1969, foi torturado e cumpriu pena de cinco anos de prisão no presídio Tiradentes, o mesmo em que a presidenta Dilma Rousseff esteve encarcerada.
Na abertura, Paulo Lage recordou a importância da atividade e o significado da ditadura para os brasileiros: “Não esquecemos que em 1964, há 49 anos, as Forças Armadas deram um golpe de Estado contra o governo democraticamente eleito de João Goulart. O golpe lançou o Brasil numa ditadura civil-militar sangrenta, que interveio em sindicatos, arrochou salários, cassou, prendeu, torturou e assassinou militantes sociais e sindicais, como o nosso Olavo Hansen. Lembrar é resistir e, por isso, as delegadas e delegados do XI Congresso dos Químicos do ABC aprovaram moção de apoio à CNV (Comissão Nacional da Verdade), instalada em março de 2012 pela presidenta Dilma. Manifestamos nosso apoio às iniciativas da Comissão, especialmente aquelas voltadas a identificar os rastros do financiamento da repressão política pelos banqueiros e industriais paulistas que criaram em 1969 a OBAN (Operação Bandeirantes), centro de investigações e torturas montado pelo exército brasileiro para combater organizações de esquerda que confrontavam o regime ditatorial. Este esforço de memória e luta pela verdade legará um serviço inestimável ao Brasil, sobretudo aos que hoje enfrentam os mesmos grupos econômicos forjados e impulsionados pelo Estado repressor da ditadura.”
Alípio lançou no ano de 2013 o documentário 1964: um golpe contra o Brasil, com produção da TVT (TV dos Trabalhadores), em que estes temas são abordados em detalhe.
- Para subsidiar o debate foi distribuído o texto Delfim Netto ainda é aquele, de autoria de João Paulo Stuart. Para acessar o documento, clique no link:
Assista ao filme Cidadão Boilesen
Lançado em 2009 e dirigido pelo cineasta Chaim Litewski, o filme mostra a estruturação e o financiamento - por empresários e banqueiros paulistas - da OBAN, "laboratório da repressão" que geraria pouco tempo depois o DOI-CODI (Destacamento de Operações de Informação do Centro de Operações de Defesa Interna). O documentário, com 80 minutos de duração, pode ser assistido na íntegra. Clique no link e confira pelo Youtube:
http://www.youtube.com/watch?v=yGxIA90xXeY&
O caso de Henning Boilesen, o cidadão Boilesen do título, é exemplar. Dinamarquês naturalizado brasileiro, trabalhou durante 19 anos no grupo químico Ultra, tendo sido presidente da Ultragaz. Anticomunista ferrenho, ligou-se a grupos militares e paramilitares e, sádico, tinha prazer especial em acompanhar sessões de tortura.
Segundo o jornalista e escritor Elio Gaspari, a primeira reunião organizada para captação de recursos para a OBAN foi convocada por Delfim Netto e contou com a participação de 15 empresários, em sua maioria banqueiros como Gastão Bueno Vidigal, dono do banco Mercantil de São Paulo (fonte: livro A ditadura escancarada, p. 61-62).
O banqueiro Vidigal era também presidente do ainda hoje elitista clube Paulistano. Lá, às quintas-feiras, costumava promover almoços com empresários e não raro convidava Delfim Netto, então ministro da Fazenda, para apresentar análises de conjuntura econômica e responder a perguntas dos presentes. Ao final da palestra, eram recolhidas as colaborações para a OBAN.
Pery Igel, dono do Grupo Ultra e patrão de Boilesen, foi certamente um dos mais destacados financiadores da OBAN, ao lado de executivos das montadoras de automóveis estadunidenses Ford e General Motors, e da empreiteira Camargo Correa.
Boilesen foi assassinado em 15 de abril de 1971, em São Paulo, numa ação conjunta envolvendo militantes da ALN (Ação Libertadora Nacional) e do MRT (Movimento Revolucionário Tiradentes). Delfim compareceu ao enterro e levou consigo Roberto Campos, amigo de ambos.
Alípio Freire, jornalista e escritor, e Paulo Lage, presidente do Sindicato dos Químicos ABC
Fotos: Dino Santos/Sindicato Químicos ABC