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Escrito por: Álvaro Luiz da Silva Alves

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Mariana e Brumadinho nunca mais!

29 de Janeiro de 2019

Não adianta viver nossa realidade por um turno, um dia, uma semana ou um mês. Vivemos em ambiente hostil, penoso, periculoso, insalubre.

Estou acompanhando as reportagens sobre o "acidente” em Brumadinho/MG e penso quantos não chegaram e não chegarão em suas residências. Quantas esposas, filhos, pais, amigos e por aí segue, estão desesperados? Quantas vidas se perderam? Como aconteceu? Não sabemos.
 
Estive em Bento Rodrigues - Mariana/MG, um ano após o "acidente" na barragem. O que vivenciei um ano após, foi tristeza, falta de esperança, abandono. Muitos brigavam, poucos faziam e a Justiça, pouca atitude. 
Agora é Brumadinho. São oficialmente, 65 mortos, infelizmente a previsão é de que existam mais. Irresponsabilidade, negligência, falta disso ou daquilo? 
 
Ouço vários especialistas, várias teorias. Devem ser ouvidos, consultados e respeitados. Precisamos reduzir os riscos, pois risco zero, penso não existir.
 
"Mariana nunca mais".
 
O que foi feito para não ocorrer mais? Quantas barragens foram inspecionadas corretamente? Quantas foram liberadas corretamente? Quais os órgãos e entidades participaram de inspeções?
 
E de Brumadinho? As demais barragens estão acima do nível de segurança esperado?
 
Parece que, o que fizeram, não foi suficiente.
 
Nós que já trabalhamos e os que trabalham na Vale, conhecem a "preocupação" com custos de produção e manutenção, bem como, fazer mais com menos. 
 
Será que agora, teremos Justiça?
 
Mais um lema, infelizmente que foi com "lama" abaixo.
 
Hoje, temos uma Vale que não vale mais. A preocupação predominante é a produção, o retorno do capital investido, os investidores. O lema "segurança em primeiro lugar" ou "você é o nosso maior patrimônio" e outros criados pela empresa, é pura balela.
 
Você empregado: é como eu fui, apenas um número, um que vende seu trabalho por uma ninharia, que vale pouco.
 
Mesmo esperando por críticas, já que o momento não é apropriado, pois muitos irão afirmar isso, vou arriscar: Quantos empregados sabiam dos riscos em trabalhar nesse local? Havia planos de contingência? Os mesmos, eram testados e os erros eram corrigidos?
 
Se forem como os planos que participei, entendo o porquê de tantas vítimas.
 
Fiz várias críticas e pouco verifiquei de melhorias.
 
Assim como Mariana, Brumadinho, existem outros projetos de mineração no qual os riscos de "acidentes" são grandes e "temos que confiar" nas informações que estamos "seguros”.
Em Rosário, também temos nossos fantasmas, pois além de estarmos em mina subterrânea, a cerca de 500 metros de profundidade, conforme comentários de quem participou da perfuração dos poços, foi necessário passar por um "lençol freático", vedando as paredes com um tipo de material, o mesmo, foi apelidado como um rio freático, ou seja, acredito que haja um risco, por menor que seja. Mas, a pergunta que faço é: quantos de nós sabemos a dimensão deste risco? Quantos sabem desta informação? Se há riscos como estes, porque os trabalhadores não recebem a periculosidade?
 
Entendo que, já que estão expostos a risco de morte, por acidentes como esses, mesmo que, ocorram em menor escala, mas decididamente, há o risco, acredito na igualdade de direitos com determinadas atividades profissionais que são reconhecidas pela Justiça/CLT. 
 
Podem até achar loucura o que escrevo, mas, aqui em nossa mina, estamos expostos a esse risco citado acima, além de bolsas de gás e não somos remunerados por tal.
 
Respeitando todos os profissionais, no qual, há suas peculiaridades, nós mineiros, empregados da mineração, estamos expostos a esses e outros riscos e sofrendo em lugares remotos, onde temos nossas vidas, regidas por restrições, fora da normalidade. 
 
Deveríamos ser reconhecidos por este governo, como categoria fora dos padrões normais, assim, não tendo nossas aposentadorias,  modificadas, alteradas, por pessoas que desconhecem nossas peculiaridades.
 
Não adianta viver nossa realidade por um turno, um dia, uma semana ou um mês; vivemos em ambiente hostil, penoso, periculoso, insalubre.
 
Somos julgados por pessoas que desconhecem nossa rotina. São juízes, peritos, senadores, deputados e outros tirando benefícios que legitimamente tínhamos. Temos direitos, mas, que agora farão falta a família de nossos colegas que se foram. Afirmo que poucos ou nenhum deles sabia dos riscos a que estavam expostos, tanto em Mariana como em Brumadinho, ou Rosário, Paracatu, Paraopeba, Salobo, Pilar, Presidente Figueiredo, Corumbá, Jacobina e tantos outros projetos, seja Vale, Mosaic, BHP, ... Por trás dessas empresas, há capital, capital, capital ....
 
Desculpas não trarão nossos companheiros mineiros, sejam funcionários próprios ou terceirizados, ou as pessoas da comunidade.
 
Não adianta um teimoso, cercado de "teimosos",  falarem “sentimos muito”. Podem até conseguir convencer alguns, mas nós, que vivemos na rotina da mineração, sabemos com o quê esse grupo de "teimosos" se preocupa.
 
Pode parecer frieza tocar em assuntos econômicos no momento, no entanto, são famílias que irão receber o famigerado seguro, mas, e a falta que esses pais, mães, filhos e outros, farão no futuro destes?  Ninguém sabe o que será daqui a alguns anos, a falta deles nestas famílias?
 
Outros serão contratados, mas, estas vítimas fatais não serão substituídas nessas famílias.
 
Outro fato que devemos ressaltar é de suma importância: em outubro de 2018, durante a reunião que trata das mudanças na NR22, representantes da SAMARCO (leia-se participação acionária da Vale) e representante da Vale, colocaram sugestão de retirar a responsabilidade deles, pelas liberações de barragens e outras, além de eliminarem o envio desses documentos aos sindicatos. Nosso representante, assim como os demais, rechaçaram tal sugestão, incluindo o Ministério Público.
 
Opinião
 
Penso que, assim como a empresa é a responsável direta pela operação e manutenção das contenções, os órgãos fiscalizadores e sindicatos são responsáveis por parte da sociedade e empregados, assim, devemos participar das fiscalizações, liberações ou não, sendo, portanto, responsabilizados, criminalmente. Não podemos, como representantes, dos trabalhadores e sociedade, nos esconder ou fugir as responsabilidades. 
 
Ao governo cabe dar valor e reconhecimento aos sindicatos, federações e confederações, que lutam por segurança e melhores condições de trabalho, e não desconstruir nosso trabalho em detrimento a corporações que estão em nosso país retirando nossas riquezas, deixando rastro de destruição e mortes, doenças e miséria em uma sociedade sofrida.
 
Precisamos de empregos, renda, mas, precisamos de respeito, de uma sociedade digna, saudável.
 
Finalizando, perguntas simples, no vocabulário de vocês, empresários, acionistas, diretores, gerentes, enfim, empregados graduados: Qual o custo em cumprir os procedimentos corretamente? Qual o custo para vocês das multas, indenizações e outras despesas?Nossas vidas valem quanto? Temos algum valor?
 
É melhor agir com respeito ao ser humano e natureza ou gastar milhões após falhas?
 
Ou ainda, vocês contam com a impunidade?