Entidades sindicais internacionais discutem a democracia e o futuro do trabalho
07 de Agosto de 2018
Sindical
Não se pode ter um bom futuro no trabalho sem democracia, afirma Victor Baez da CSA
Cerca de 150 sindicalistas de 40 países dos cinco continentes estiveram reunidos nesta terça-feira (7), na sede da CUT nacional, em São Paulo, para debater o futuro do trabalho e os perigos à democracia, provocados por movimentos neoliberais e de direita, que cada vez mais proíbem o direito à greve e à manifestação de trabalhadores e trabalhadoras em todo o mundo.
Na abertura do evento, cujo tema foi “O Futuro do Trabalho: Democracia, Desenvolvimento e o Papel do Trabalho”, o presidente da CUT Vagner Freitas, aproveitou para falar sobre a democracia brasileira, que vem sendo atacada desde o golpe de 2016, dos retrocessos sociais e trabalhistas e da criminalização aos movimentos sociais e sindicais, e como tudo isso compromete o futuro dos trabalhadores e trabalhadoras do país.
“O objetivo do golpe de 2016 foi o de destruir a CUT, o MST, o PT, os movimentos populares e o Lula como referência de liderança no Brasil e personalidade do mundo. Mas os golpistas não vão nos destruir. Vamos enfrentá-los nas ruas e nas urnas e vamos vencer”, declarou Vagner.
Segundo o presidente da CUT, a presença maciça de lideranças sindicais da América Latina, Estados Unidos, Europa, África e Ásia na Conferência é uma demonstração de força do sindicalismo brasileiro e da unidade entre os trabalhadores e trabalhadoras de todo o mundo.
“Enquanto a mídia brasileira se cala e nos censura diante das arbitrariedades, nós só temos a agradecer a vocês aqui presentes que são a nossa voz lá fora para desmascarar os golpistas e dizer que Lula é inocente, que ele está forte e animado. Lula só não será candidato se rasgarem a Constituição”, disse Vagner que foi acompanhado de um coro da plateia que gritou em várias línguas de “Lula Livre”.
Para o secretário de Relações Internacionais da CUT, Antonio Lisboa, realizar esse projeto no Brasil e na sede da CUT tem um significado importante pelo momento em que o país vive - de perda de direitos.
“Para o movimento sindical mundial há clareza de que Lula é inocente e, é um preso político. Ele foi condenado num processo absurdo e que os objetivos da sua condenação e prisão são a consolidação do golpe de estado no Brasil. E, por isso, estamos lutando por sua liberdade com a abertura de comitês internacionais por ‘Lula Livre’ e outros comitês surgirão”, acredita Lisboa.
A relação que os dirigentes da CUT fizeram entre democracia e os riscos que o futuro do mundo do trabalho correm foram referenderadas por todos os dirigentes de entidades internacionais. Para todos, o golpe que destitutiu a presidenta Dilma Rousseff acendeu o sinal de alerta no mundo para a perda de direitos e fortalecimento da onda neoliberal.
Segundo Christoph Scherrer, do International Center for Development and Decent Work (ICDD), o golpe de 2016 no Brasil, que depôs uma presidenta eleita democraticamente com 54 milhões de votos, colocou o mundo em alerta, especialmente dos trabalhadores que temem que ocorram em seus países o mesmo o que aconteceu no Brasil: a perda de direitos e ataques ao direito de greve e manifestação.
“O Brasil é um exemplo de como a perda do financiamento sindical eliminou direitos. Há poucos anos o Brasil era visto como exemplo de políticas progressistas e hoje se nota a perda rápida desses direitos. Isto nos coloca em alerta. Não podemos só confiar nos bons políticos, precisamos de uma sociedade forte”, declarou Scherrer, durante a mesa de abertura do evento.
Para Katharina Hofmann, da Fundação Friedrich Ebert (FES), entidade que promove a democracia em todo o mundo, o golpe de 2016 trouxe de volta a extrema miséria, a fome e o desemprego recorde de 13 milhões de trabalhadores e trabalhadoras.
“Lula e Dilma mostraram ao mundo que é possível reduzir a pobreza. O Brasil vive seu pior momento após a ditadura militar. O país vive sob um governo que não foi eleito, sem legitimidade, e a prisão de Lula, líder em todas as pesquisas eleitorais, reforça a necessidade de defendermos a democracia brasileira”, ressaltou a dirigente da FES.
Já Michelle Williams, representante da Universidade Global do Trabalho (GLU), disse que o mundo do trabalho vive a ‘tormenta perfeita’ e, que é preciso a união da classe trabalhadora.
“Os ricos estão cada vez mais ricos, obscenamente ricos, enquanto mais de 2 bilhões de pessoas em todo mundo, que representam 1/3 da população, estão sem trabalho formal. Além disso, há uma crise de alimentação provocada pelas tempestades ,furacões e o aumento da temperatura no globo”, enfatizou Williams.
Democracia e mudanças climáticas afetam o mundo do trabalho
Sobre as conseqüências das mudanças climáticas no mundo do trabalho, Rafael Peels, da Organização Mundial do Trabalho (OIT), lembrou que já é uma realidade, e que elas farão desaparecer trabalhos como a pesca e o extrativismo, entre outras atividades.
“As mudanças climáticas, o envelhecimento da população, as mudanças das profissões e das relações de trabalho. Todos esses fatores precisam ser estudados com maior profundidade para que os trabalhadores consigam manter um emprego decente”, disse o representante da OIT.
Os ataques à democracia também na América Latina e aos direitos dos trabalhadores e sindicatos com a imposição de pesadas multas às categorias que realizam movimentos grevistas foram lembradas por Anselmo Luis dos Santos, do CESIT/IE/UNICAMP.
“O Brasil e a América Latina vivem uma situação dramática com governos cada vez mais de extrema direita. Por isso, a solidariedade de todos os trabalhadores do mundo, neste momento, é de suma importância”, declarou.
A situação da América Latina também foi criticada por Victor Baez, da CSA, que participou da mesa “Mudanças Estruturais e Futuro do Trabalho”. O dirigente relatou as pesadas multas que o governo argentino sob o comando de Mauricio Macri, vem aplicando aos sindicatos.
“Multaram os caminhoneiros em US$ 26 milhões e os professores de Buenos Ayres em US$ 23 milhões. Isto é suprimir o direito de greve”, afirmou o dirigente da CSA.
A falta de democracia e os avanços de governo de direita também preocupam Victor Figueroa, da International Transport Workers’ Federation (ITF). Segundo ele, a instabilidade global e os conflitos em países como a Ucrânia, Síria e Venezuela promovidos por governos externos de direita demonstram que há uma crise na ideologia social democrática.
“Há um esforço de Trump (presidente dos Estados Unidos) e seus aliados, que viajam pelo mundo, em promover novas alianças antidemocráticas”.
Já sobre o uso da tecnologia, para o representante da ITF, o mais preocupante é o armazenamento de dados pessoais por empresas particulares.
“A revolução tecnológica trará um impacto negativo por razões diferentes. Não é somente a questão da robotização, mas também como os dados de trabalhadores dentro de uma empresa poderão ser utilizados”.
Pochmann defende redução de jornada e mudanças nas idades de entrada no mercado de trabalho e também na saída
O presidente da Fundação Perseu Abramo, Marcio Pochmann, disse que pensar o futuro do trabalho é debater coisas como o aumento da idade em que os jovens que ingressam no mercado do trabalho e a diminuição da idade de saída dos trabalhadores mais velhos.
Ele lembrou que, no início da revolução industrial, era comum crianças de cinco anos trabalharem e que as pessoas trabalhavam até morrer, sem assistência, sem aposentadoria.
“Os filhos dos ricos só ingressam no mercado de trabalho após estarem formados em universidades, enquanto os pobres estudam e trabalham. Na verdade, os pobres frequentam a escola porque não dá para estudar após uma jornada de oito horas de trabalho”, sustentou.
Além de defender a redução da jornada de trabalho, Pochmann disse que há um exagero no discurso de que robôs roubarão os empregos dos trabalhadores.
“Isso enfraquece os sindicatos, pois é um discurso de exploração dos patrões que falam que o trabalhador tem de se qualificar, se adaptar. É preciso reduzir a jornada, abrir mais vagas, para que o trabalhador possa viver com dignidade e os jovens não precisem ir tão cedo ao mercado de trabalho”.
Desafio para as mulheres
A representante do Centro Interdisciplinar de Estudos sobre o Desenvolvimento (CIEDUR), do Uruguai, Soledad Salvador, lembrou dos desafios que as mulheres enfrentam no mundo do trabalho.
“A falta de condições dignas, os salários menores e a redução de vagas para as mulheres que vem sendo notada desde 2005 reforçam os estereótipos de gênero e por tudo isso é preciso lutar por uma sociedade mais democrática”, declarou a dirigente uruguaia.
Ato Lula Livre
Ao final da 13ª Conferência da Universidade Global do Trabalho (Global Labor University - GLU), foi realizado um Ato Internacional em Defesa da Democracia e de Lula, com a participação de mais de 100 convidados internacionais, entre eles sindicalistas, ativistas e acadêmicos de todos os continentes, além dos convidados nacionais.
Nessa quarta (8) e na quinta (9), outras mesas da Conferência serão realizadas na Unicamp, em Campinas.